quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Grande Pauliceia: Veredas - Glorinha do Capão Redondo


Tudo tem limite, exceto a beleza de Glorinha do Capão Redondo! Ela não é Capitu, mas também tem olhos de ressaca. Não é mais uma menina, mas a juventude teima em morar no sorriso imutável da mulher cujos olhos irradiam inusitada luz verde! Tipo esguio, cabelos sempre soltos ao vento. Filha de Iansã. No verão ou no inverno; de dia ou de noite, gosta de vestido longo para sair. Gosta também de Ray-Ban, modelo aviador. Uma mulher em busca de uma estética que a defina, individualizando-a na multidão de uma cidade que chora com um olho só! Muitos dizem que ela é chique, outros, uma mulher esquisita, de gosto duvidoso. Mas num ponto, todos estão de acordo: Glorinha do Capão Redondo é lindamente desvairada! Sabe proferir palavrões com a mesma elegância que, em mesa de bares, declama “Traduzir-Se”, seu poema preferido. Tudo pode ser explicado, exceto a complexidade de Glorinha do Capão Redondo. Ninguém sabe ao certo sua origem. Sabe-se apenas que chegou a São Paulo no comecinho da década de 80, quando era uma menina inquieta, no frescor dos seus dezassete anos. Amava Pink Floyd e Caetano Veloso! Amava também um bom vinho tinto. E, nos fins de semana, não dispensava um cigarrinho de maconha. Glorinha amou alguns poucos homens, mas não quis ficar com nenhum deles: dizia não ter vocação para “dona de casa”. Com Víctor, foi mãe de Jorge Lennon, seu único filho, que hoje, aos 23 anos, resolveu dar um “rolê” por Amsterdam. Jorge Lennon: foi-lhe dado este nome em homenagem a John Lennon e a São Jorge. Glorinha sabe que Jorge Lennon saiu a ela, tem, portanto, espírito aventureiro e não deve estar em Amsterdam frequentando missas dominicais. Em São Paulo, Glorinha, uma Loba em plenitude; no que se refere à cria, é como qualquer mulher: morre de saudades do filho, cujo nome está tatuado em seu pé esquerdo. Muita saudade, sem, contudo, perder a capacidade de ser feliz. Glorinha e Jorge Lennon estão em constante contato pela Internet e vez por outra, falam-se por telefone. Da mãe, Lennon herdou o enigmático olhar verde e o prazer pela "aventura existencial"; do pai, sobrancelhas espessas e negríssimas, que contrastam com os belos olhos verdes e tez clara! Víctor, seu pai, agora é Pastor em uma igreja evangélica e sonha levar Glorinha e Lennon para o “Caminho da Salvação e da Luz”. Só que Victor se esquece que dos olhos de Glorinha sempre emanou toda luz que ela necessita para chegar a Seus Portos Seguros. Uma Luz Verde emana dos olhos de Glorinha do Capão Redondo! Glorinha nuca foi Santa, mas também nunca foi Puta e Jorge Lennon é o Fruto do seu Ventre, Victor é a Pedra em seu Sapato "Dolce & Gabbana". De onde Glorinha veio, poucos sabem, mas numa observação mais atenta de sua entonação, percebe-se, bem lá no fundo, um leve sotaque nordestino. Talvez, Jorge Lennon seja o único a conhecer, na íntegra, a história da mãe. Não sei por que ainda a chamam de Glorinha do Capão Redondo, se já faz muito mais de dez anos que se mudou do Capão, sem, contudo, cortar os laços com o lugar que a acolheu naquele verão de 1982. Todo último domingo de todos os meses, no bar de Pedrinho da Paraíba, velhos amigos se reúnem para a famosa “Feijoada de Rosa Maria” e, evidentemente, Glorinha é presença certa! Cerveja, Feijoada e Samba de Raiz fecham o mês em azul, naquelas bandas da Grande Paulicéia Desvairada! Boa Música e a Alegria de Viver tomam conta dessas tardes de domingo. Tardes que confirmam que o tempo não pára e confirmam também que a canção está certa ao dizer que amigo é coisa pra se guardar dentro do coração...

Paulo Neumann

Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com nomes (pessoas) ou fatos reais terá sido mera coincidência. (Direitos Autorais Reservados)

Todas as fottos utilizadas nas montagens são do fotógrafo Adrebal lírio